A Lei Geral de Proteção de Dados elenca uma série de possíveis sanções administrativas a serem aplicadas pela ANPD – Agência Nacional de Proteção de Dados – aos agentes de tratamento de dados que eventualmente cometam infrações às normas previstas na própria lei.
Dentre as sanções elencadas no art. 52, da Lei nº 13.709/2019, vale falar um pouco sobre aquelas que prescrevem a suspensão de atividades de tratamento de dados e proibição de atividades. Elas estão previstas nos incisos abaixo transcritos.
a) X – suspensão parcial do funcionamento do banco de dados a que se refere a infração pelo período máximo de 6 (seis) meses, prorrogável por igual período, até a regularização da atividade de tratamento pelo controlador;
b) XI – suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais a que se refere a infração pelo período máximo de 6 (seis) meses, prorrogável por igual período; e
c) XII – proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados.
Esses três incisos trazem sanções que merecem destaque, na medida em que, a depender do ramo de atividade da empresa (imagine-se uma empresa constituída com o fim específico de tratar dados para outras empresas, de forma terceirizada), sua aplicação pode inviabilizar o exercício daquela atividade econômica, representando, na prática, a “morte” da empresa.
Não à toa, a própria LGPD prevê, em seu art. 52. §6º, que as sanções previstas nos incisos X, XI e XII serão aplicadas somente após já ter sido aplicada, em razão do mesmo fato, ao menos uma das penalidades de: (i) multa simples; (ii) multa diária; (iii) publicização da infração; (iv) bloqueio dos dados a que se refere a infração e (v) eliminação dos dados a que se refere a infração (incisos II a VI, do art. 52, da LGPD).
Vê-se, pois, que apenas serão aplicadas as sanções de suspensão parcial, total, ou proibição de tratamento de dados em caso de reincidência relativa à mesma infração. Em outras palavras, essas sanções somente serão aplicadas se o agente de tratamento de dados, mesmo após punido pelo cometimento de infração à LGPD, persistir no cometimento do ato ilícito.
Os incisos X e XI, do art. 52, da LGPD, tratam da possibilidade de se aplicar ao agente de tratamento infrator as sanções de suspensão das atividades de tratamento de dados.
As suspensões de que tratam referidos artigos podem ocorrer no período máximo de 1 ano – a lei fala em período máximo de 6 meses, prorrogáveis por igual período. No caso da suspensão parcial, prevista no inciso X, há expressa previsão de que a suspensão parcial ocorra até a regularização da atividade de tratamento pelo controlador.
A primeira dúvida que surge é se, ante o silêncio do inciso XI (suspensão total) acerca da possibilidade de duração da sanção até a regularização da atividade, no caso desta ocorrer antes de exaurido o período previsto na sanção, poderá o operador requerer a retomada da atividade, com o encerramento da suspensão.
Imagine-se o caso em que o agente, punido com a suspensão total do tratamento de dados prevista no inciso XI, do art. 52, da LGPD, pelo período de 6 meses, demonstra à ANPD ter regularizado a situação que havia ensejado a aplicação da penalidade, em 2 meses. Nesse caso, poderia cessar imediatamente a sanção, inicialmente de um semestre, ante o silêncio do referido inciso a respeito dessa possibilidade?
E, nesse caso, como deverá proceder o agente punido para pleitear a redução, ou extinção da penalidade imposta, ante a adequação da atividade de tratamento de dados às normas previstas na LGPD?
Para refletir sobre o tema, vale lembrar o que dispõe a Súmula nº 473, do Supremo Tribunal Federal:
“A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque dêles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.” (g/n)
No que pertine à sanção de proibição (parcial ou total) do exercício da atividade de tratamento de dados, prevista no inciso XII, do art. 52, da LGPD, é com ter em mente se tratar da punição mais severa, dentre aquelas elencadas pela lei em exame.
Isso porque, ao se proibir – por tempo indeterminado, ao que parece – a atividade de tratamento de dados, está se tornando inviável a existência de uma série de empresas cujo objeto seja justamente o tratamento de dados ou, ao ainda que não seja seu objeto social, dele dependam para poder regularmente exercer suas atividades.
Cumpre destacar que, embora não se trate de direito absoluto, podendo a lei o restringir, há expressa previsão constitucional (art. 5º, XIII) acerca da garantia fundamental ao exercício de qualquer trabalho, verbis:
“XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”
Ora, os direitos ao trabalho e à livre iniciativa se traduzem em verdadeiros valores sociais que são fundantes do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III e IV, da Constituição Federal).
Assim, para que se proíba alguém de exercer sua atividade lícita, é preciso haver fortíssima justificativa jurídica e fática fundada em ordem pública, porquanto isso pode impedir a pessoa de garantir seu sustento (e de sua família), por meio de seu trabalho, ou, no caso, com o exercício de sua profissão.
Portanto, ao que parece, a melhor interpretação é a que tais punições só poderiam ser aplicadas em caso de permanência da infração, mesmo após já aplicada sanção mais branda.
Todavia, resta saber se a proibição de que fala a lei terá algum limite temporal, podendo ser revista após o decurso de determinado prazo de tempo, ou ainda após a comprovação, pelo agente infrator, da tomada de medidas capazes adequar sua atividade às exigências legais. Ainda não está regulamentada o assunto, o que dá margem a grandes discussões.
Outra questão que merece destaque é a ausência de previsão legal a respeito de maneiras de se evitar eventuais manobras societárias praticadas com o fito de driblar a proibição do exercício da atividade de tratamento, como por exemplo, pela constituição de diferentes pessoas jurídicas.
Por fim, vale lembrar, como já mencionado anteriormente, os atos da administração estão sujeitos à apreciação do Judiciário, podendo aqueles que se sentirem prejudicados se socorrer da Justiça para (re)discutir a questão.